II Parte
CONCÍLIO
DE TRENTO
(1543-1563)
XIX
CONCÍLIO ECUMÊNICO
(CONTRA
OS INOVADORES DO SÉCULO XVI)
Sessão
V (17-6-1546)
Decreto
sobre o pecado original
787. Para
que a nossa fé católica, sem a qual é impossível agradar a Deus (Heb 11,
6), purificada dos erros, permaneça em sua pureza íntegra e ilibada; e para que
o provo cristão não se deixe agitar por qualquer sopro de doutrina (Ef
4, 14) – pois aquela antiga serpente, que foi inimiga do gênero humano desde o
princípio, entre os muitos males que perturbam a Igreja de Deus em nossos
tempos, também suscitou a respeito do pecado original e do seu antídoto, não só
novas mais ainda antigas dissenções – o sacrossanto Concílio Ecumênico e Geral
de Trento, legitimamente reunido no Espírito Santo, presidindo-o os mesmo três
legados da Sé Apostólica, querendo tratar logo de chamar [à fé] os que laboram
em erro e confirmar os vacilantes, tendo seguido os testemunhos da Sagrada
Escritura, dos Santos Padres e de Concílios autorizadíssimos bem como o juízo e
o consenso da própria Igreja, estabelece, confessa e declara o seguinte a
respeito do mesmo pecado original:
788.
1) Se alguém não confessar que o primeiro homem Adão, depois de
transgredir o preceito de Deus no paraíso, perdeu imediatamente a santidade e a
justiça em que havia sido constituído; e que pela sua prevaricação incorreu na
ira e indignação de Deus e por isso na morte que Deus antes lhe havia ameaçado,
e, com a morte, na escravidão e no poder daquele que depois teve o
império da morte (Heb 2, 14), a saber, o demônio; e que Adão por aquela
ofensa foi segundo o corpo e a alma mudado para pior – seja excomungado.
789.
2) Se alguém afirmar que a prevaricação de Adão prejudicou a ele só e não
à sua descendência; e que a santidade e justiça recebidas de Deus, e por ele
perdidas, as perdeu só para si e não também para nós; ou [disser] que, manchado
ele pelo pecado de desobediência, transmitiu a todo o gênero humano somente a
morte e as penas do corpo, não porém o mesmo pecado, que é a morte da alma – seja
excomungado, porque contradiz o Apóstolo que diz: Por um só homem entrou
o pecado no mundo, e pelo pecado a morte e assim a morte passou para todos os
homens, no qual todos pecaram. (Rom 5, 12).
790.
3) Se alguém afirmar que esse pecado de Adão – que é um pela origem e
transmitido pela propagação e não pela imitação, mas que é próprio de cada um –
se apaga ou por forças humanas ou por outro remédio, que não seja pelos méritos
de um único mediador nosso Jesus Cristo, que nos reconciliou com Deus por seu
sangue, fazendo-se para nós justiça, santificação e redenção (I Cor 1,
30); ou negar que o mesmo mérito de Jesus Cristo, devidamente conferido pelo
sacramento do Batismo na forma da Igreja, é aplicado tanto aos adultos como às
crianças – seja excomungado, porque sob o céu nenhum outro nome foi
dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos (At 4, 12); daí aquela
palavra: Eis o cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo (Jo 1, 29);
e esta outra: Todos vós que fostes batizados em Cristo, vos vestistes de
Jesus Cristo (Gl 3, 27).
791.
4) Se alguém negar que se devam batizar as crianças recém-nascidas, ainda
mesmo quando nascidas de pais batizados; ou disse que devem ser batizadas, sim,
para a remissão dos pecados, mas que nada trazem do pecado original de Adão que
seja necessário expiar-se no lavacro da regeneração para conseguir a vida
eterna, donde resulta que neles a forma do batismo não deve ser entendida como
em remissão dos pecados – seja excomungado, porque não é de outro modo
que se deve entender o que o Apóstolo: Por um só homem entrou o pecado no
mundo e pelo pecado a morte e assim a morte passou a todos os homens naquele em
que todos pecaram (Rom 5, 12), senão do modo que a Igreja Católica,
espalhada por todo o mundo, sempre o entendeu; porquanto, em razão desta regra
de fé, segundo a tradição dos Apóstolos, ainda as criancinhas que não puderam
cometer nenhum pecado, também são verdadeiramente batizadas para a remissão dos
pecados, a fim de ser nelas purificado pela regeneração o que contraíram pela
geração, pois, se alguém não renascer da água e do Espírito Santo, não pode
entrar no reino de Deus (Jo 3, 5).
792.
5) Se alguém negar que pela graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, conferida
no Batismo, é perdoado o reato do pecado original. Ou se afirmar que não é
tirado tudo o que tem verdadeira e própria razão de pecado, mas disser que este
é tão somente riscado ou não imputado (sed illud dicit tantum radi aut non imputari)
– seja excomungado. Pois Deus nada odeia nos regenerados, visto nada
haver de condenação nos que foram verdadeiramente sepultados com Cristo pelo
batismo para a morte (Rom 6, 4), os quais não andam segundo a carne (Rom
8, 1), mas despojando-se do homem velho, e revestindo-se do novo que foi
criado segundo Deus (Ef 4, 22 ss; Col 3, 9 s), se tornaram sem mancha,
imaculados, puros, inocentes, filhos amados de Deus e herdeiros de Deus
(Rom 8, 17), de maneira que nada os impede de entrarem logo no céu. Que fique,
porém, nos batizados a concupiscência ou o "estopim", [fomes], isto o
santo Concílio confessa e sente; mas tendo sido isto deixado para a luta, não
pode prejudicar aos que não consentem e lutam varonilmente [auxiliados] pela
graça de Jesus Cristo. Mas, pelo contrário, só será coroado quem
legitimamente combater (2 Tim 2, 5). O santo Concílio declara que a Igreja
Católica jamais entendeu que esta concupiscência – pelo Apóstolo denominada pecado
(Rom 6, 12 ss) – se chame "pecado" por ser verdadeira e propriamente
pecado nos renascidos, mas por se originar do pecado e nos inclinar ao pecado.
Se alguém entender o contrário, seja excomungado.
6) Este
mesmo santo Concílio também declara não ser de sua intenção neste decreto, em
que se trata do pecado original, incluir a Bem-aventurada e Imaculada Virgem
Maria, Mãe de Deus, mas que se devem observar as Constituições do Papa Xisto
IV, de feliz memória, sob as penas contidas naquelas mesmas Constituições, que
[este Concílio] renova.
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