XVI Parte
CONCÍLIO
DE TRENTO
(1543-1563)
XIX
CONCÍLIO ECUMÊNICO
(CONTRA
OS INOVADORES DO SÉCULO XVI)
SESSÃO XXII (17-9-1562)
DOUTRINA SOBRE O SANTÍSSIMO SACRIFÍCIO DA MISSA
937 a. Para que se mantenha íntegra na Igreja Católica a antiga fé
e doutrina do grande mistério eucarístico, e, debelados os erros e heresias, se
conserve em sua pureza, o sacrossanto Concilio Ecumênico e Geral de Trento,
instruído pela ilustração do Espirito Santo,... Ensina, declara e determina no
que segue o que deve ser pregado aos povos fiéis a respeito [da Eucaristia]
enquanto é um verdadeiro e singular sacrifício.
Cap. 1. — Da instituição do sacrossanto sacrifício da Missa[15]
Cap. 1. — Da instituição do sacrossanto sacrifício da Missa[15]
938. Já que no Antigo Testamento,
segundo testifica o Apóstolo S. Paulo, por causa da fraqueza do sacerdócio
levítico não havia perfeição, convinha, por disposição de Deus, Pai da
misericórdia, se levantasse outro sacerdote segundo a ordem de Melquisedec (Gên
14, 18; Sl 109, 4; Heb 7, 11), Nosso Senhor Jesus Cristo, que pudesse consumar
(Heb 10, 14) e levar à perfeição todos os que se houvessem de santificar
(Heb 10, 14). Assim, este Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo, embora por sua
morte se havia de oferecer uma só vez ao Eterno Pai no altar da cruz,
para nele obrar a redenção eterna, contudo, já que pela morte não se devia
extinguir o seu sacerdócio (Heb 7, 24. 27), na última ceia, na noite em que ia
ser entregue, querendo deixar à Igreja, sua amada Esposa, como pede a natureza
humana, um sacrifício visível [cân. l] que representasse o sacrifício cruento a
realizar uma só vez na Cruz, e para que a sua memória durasse até a consumação
dos séculos e a sua salutar virtude fosse aplicada para remissão dos nossos
pecados quotidianos, declarando-se sacerdote perpétuo segundo a ordem de
Melquisedec (Sl 109, 4), ofereceu a Deus Pai o seu corpo e sangue sob as
espécies do pão e do vinho e, sob as mesmas espécies, entregou Corpo e Sangue
aos Apóstolos que então constituiu sacerdotes do Novo Testamento para que o
recebessem, mandando-lhes, e aos sucessores deles no sacerdócio, que fizessem a
mesma oblação: Fazei isto em memória, de mim (Lc 22, 19; l Cor 11, 24),
como a Igreja Católica sempre entendeu e ensinou [cân. 2]. E assim, celebrada a
antiga Páscoa, que a multidão dos filhos de Israel imolava em memória da saída
do Egito (Ex 12, l ss), instituiu a nova Páscoa, imolando-se a si mesmo pela
Igreja por mão dos sacerdotes, debaixo de sinais visíveis, em memória do seu trânsito
deste mundo para o Pai, quando nos remiu pela efusão do seu sangue e nos
tirou do poder das trevas, transferindo-nos ao seu reino (Col l, 13).
939. Esta é a oblação pura que
se não pode manchar com indignidade ou malícia alguma dos que a oferecem, que o
Senhor predisse por Malaquias se haveria de oferecer, em todo lugar, pura ao
seu nome (Mal l, 11), que havia de ser grande entre as gentes. A esta
oblação alude claramente S. Paulo escrevendo aos Coríntios que não podem
aqueles que estão manchados com a participação da mesa dos demônios,
fazer-se participantes da mesa do Senhor (l Cor 10, 21), entendendo por
mesa o altar, em um e outro lugar. Finalmente, este é aquele sacrifício
figurado por várias semelhanças de sacrifícios na lei natural e na escrita (Gn
4, 4; 8, 20; 12, 8. 22), pois encerra todos os bens significados por aqueles
sacrifícios como consumação e perfeição que é de todos eles.
Cap. 2. — O sacrifício
visível é propiciatório pelos vivos e defuntos
940. E como neste divino sacrifício,
que se realiza na Missa, se encerra e é sacrificado incruentamente aquele mesmo
Cristo que uma só vez cruentamente no altar da cruz se ofereceu a si
mesmo (Heb 9, 27), ensina o santo Concilio que este sacrifício é
verdadeiramente propiciatório [cân. 3], e que, se com coração sincero e fé
verdadeira, com temor e reverência, contritos e penitentes nos achegarmos a
Deus, conseguiremos misericórdia e acharemos graça no auxilio
oportuno (Heb 14, 16). Porquanto, aplacado o Senhor com a oblação dele e
concedendo o dom da graça e da penitência, perdoa os maiores delitos e pecados.
Pois uma e mesma é a vítima: e aquele que agora oferece pelo ministério dos
sacerdotes é o mesmo que, outrora, se ofereceu na Cruz, divergindo, apenas, o
modo de oferecer. Os frutos da oblação cruenta se recebem abundantemente por
meio desta oblação incruenta, nem tão pouco esta derroga aquela [cân. 4]. Por
isso, com razão se oferece, consoante a Tradição apostólica, este sacrifício
incruento, não só pelos pecados, pelas penas, pelas satisfações e por outras
necessidades dos fiéis vivos, mas também pelos que morreram em Cristo, e que
não estão plenamente purificados [cân. 3].
Cap. 3. — As missas em
honra dos santos
941. Ainda que a Igreja costume
celebrar às vezes algumas missas em honra e memória dos Santos, contudo não diz
que se lhes oferecem sacrifícios, mas unicamente a Deus, que os coroou [cân.
5]. É "por isso que o sacerdote não costuma dizer: Ofereço-vos este
sacrifício, S. Pedro ou S. Paulo” [16],
mas, dando graças a Deus pelas vitórias dos Santos, implora o patrocínio deles
para que se dignem interceder por nós nos céus aqueles, cuja memória
celebramos na terra [Missal].
Cap. 4. — O Cânon da missa
942. Sendo conveniente que as coisas
santas se administrem santamente, e sendo este sacrifício entre todos o mais
santo, instituiu a Igreja Católica já há muitos séculos o Cânon sagrado, tão
purificado de todo o erro [cân. 6], que nele não há nada que não rescenda a
suma santidade e piedade, nada que não eleve a Deus as almas dos que o
oferecem. Pois ele se compõe das palavras do mesmo Senhor, como das tradições
dos Apóstolos e das piedosas instituições dos Sumos Pontífices.
Cap. 5. — As cerimonias
solenes do santo sacrifício da missa
943. Já que a natureza humana é tal,
que não pode, facilmente e sem socorros exteriores, elevar-se a meditar as
coisas divinas, por isso a Igreja, piedosa Mãe que é, instituiu certos ritos
para se recitarem na missa, uns em voz submissa [cân. 9], outros em voz alta.
Juntou a isto cerimônias [cân. 7], como bênçãos místicas, luzes, vestimentas e
outras coisas congêneres da Tradição apostólica, com que se fizesse perceptível
a majestade de tão grande sacrifício, e para que o entendimento dos fiéis se
excitasse, por meio destes sinais visíveis da religião e da piedade, à contemplação
das coisas altíssimas que se ocultam neste sacrifício.
Cap. 6. — A missa em que só
o sacerdote comunga
944. Desejaria o sacrossanto Concílio
que os circunstantes que assistem a cada uma das Missas comungassem, não só
espiritualmente, mas também com a recepção sacramental da Eucaristia, a fim de
participarem mais abundantemente dos frutos deste santíssimo sacrifício.
Contudo, se tal nem sempre se dá, nem por isso condena como privadas e ilícitas
aquelas Missas em que somente o sacerdote comunga sacramentalmente [cân. 8],
pois na verdade também estas Missas se devem considerar comuns, já porque nelas
comunga o povo espiritualmente, já porque as celebra o ministro público da
Igreja, não somente por si, mas por todos os que pertencem ao corpo [místico]
de Cristo.
Cap. 7. — A água que se
deve ajuntar ao vinho, quando se oferece o cálice
945. Admoesta mais o santo Concílio ser
preceito da Igreja que os sacerdotes ajuntem água ao vinho ao oferecerem o
cálice [cân. 9], tanto porque se presume que assim o fez Cristo Senhor Nosso,
como também porque do seu lado saiu juntamente sangue e água (Jo 19,
34), mistério que é comemorado por este rito. E como no Apocalipse de S. João os
povos se comparam à água (Apoc. 17, l 15), representa-se por este
rito a união do mesmo povo fiel à sua cabeça, Cristo.
Cap. 8. — Que a missa
ordinariamente não se deve celebrar em língua vulgar e da explicação de seus
mistérios ao povo
946. Se bem que a Missa encerre grandes
ensinamentos para o povo fiel, contudo pareceu aos Padres não ser conveniente
se celebrasse ordinariamente na língua vulgar [cân. 9]. Por isso, conservando o
rito aprovado em toda parte de cada uma das Igrejas e da Santa Igreja Romana,
Mãe e Mestra de todas, e para que as ovelhas de Cristo não sintam fome e não
suceda que os pequeninos peçam pão e não haja quem lho reparta (Lam. Jr.
4, 4), manda o santo Concílio aos pastores e a cada um dos que têm cura de
almas, que durante a celebração da missa expliquem frequentes vezes por si ou
por outros algo sobre o que se lê na missa, e falem sobre algum mistério deste
santíssimo sacrifício, principalmente nos domingos e festas.
Cap. 9. — Introdução aos
cânones que seguem
947. Como neste tempo se têm semeado
muitos erros, muitas coisas se ensinam e disputam contra esta fé, fundado no
santo Evangelho e nas Tradições dos Apóstolos, determina o santo Concílio,
depois de muitas e maduras reflexões sobre estas matérias, com o consentimento
unânime de todos os Padres, condenar com os seguintes cânones e expulsar da
santa Igreja os que se opõem a esta fé puríssima e sagrada doutrina.
Cânones sobre o santíssimo
sacrifício da Missa
948. Cân. 1. Se alguém disser
que na Missa não se oferece a Deus verdadeiro e próprio sacrifício, ou que
oferecer-se Cristo não é mais que dar-se-nos em alimento — seja excomungado [cfr.
n° 938].
949. Cân. 2. Se alguém disser
que Cristo não instituiu os Apóstolos sacerdotes com estas palavras: Fazei
isto em memória de mim (Lc 22, 19; l Cor 11, 24), ou que não ordenou que
eles e os demais sacerdotes oferecessem o seu Corpo e Sangue — seja
excomungado [cfr. n° 938].
950. Cân. 3. Se alguém disser
que o sacrifício da Missa é somente de louvor e ação de graças, ou mera
comemoração do sacrifício consumado na cruz, mas que não é propiciatório, ou
que só aproveita ao que comunga, e que não se deve oferecer pelos vivos e
defuntos, pelos pecados, penas, satisfações e outras necessidades — seja
excomungado [cfr. n° 940].
951. Cân. 4. Se alguém disser
que o santo sacrifício da Missa é uma blasfêmia contra o santíssimo sacrifício
que Cristo realizou na Cruz, ou que aquele derroga este — seja excomungado [cfr.
n° 040].
952. Cân. 5. Se alguém disser
que é impostura celebrar Missas em honra dos Santos com o fim de conseguir a
sua intercessão junto a Deus, como é intenção da Igreja — seja excomungado [cfr.
n° 941].
953. Cân. 6. Se alguém disser
que o Cânon da Missa contém erros e por isso se deve ab-rogar – seja
excomungado [cfr. n° 942].
954. Cân. 7. Se alguém disser
que as cerimônias, as vestimentas e os sinais externos de que a Igreja Católica
usa na celebração da Missa são mais incentivos de impiedade do que sinais de
piedade — seja excomungado [cfr. n° 943].
955. Cân. 8. Se alguém disser
que as Missas em que só o sacerdote comunga são ilícitas e por isso se devem
ab-rogar — seja excomungado [cfr. n° 944].
956. Cân. 9. Se alguém disser
que o rito da Igreja Romana que prescreve que parte do Cânon e as palavras da
consagração se profiram em voz submissa, se deve condenar, ou que a Missa se
deve celebrar somente em língua vulgar, ou que não se deve lançar água no
cálice ao oferecê-lo, por ser contra a instituição de Cristo — seja
excomungado [cfr. n° 943, 945 s].
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16 S. Agostinho, C. Faustum, 20, 21 (PL 42, 384).
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