Não falamos aqui das confissões das pessoas incursas, ou seja, que incorreram em pecados mortais.
Entretanto não deixaremos de dar muitos avisos concernentes às ocasiões
próximas e às confissões sacrílegas. Mas queremos falar principalmente das
confissões das almas timoratas, (consciências refinadas) que pela graça divina alcançaram esse avança na vida espiritual e assim amam a perfeição e procuram purificar-se
cada vez mais das manchas dos pecados veniais.
UTILIDADE DA
CONFISSÃO FREQÜENTE
Refere Cesário que um
santo sacerdote mandou da parte de Deus a um demônio que lhe tinha aparecido,
lhe dissesse o que mais o maltratava; e o inimigo lhe respondeu que nada o
contrariava nem o desgostava tanto, como a confissão freqüente. - Mas ouçamos o
que Jesus Cristo disse a Sta. Brígida: "Aquele que quer conservar o
fervor, deve purificar-se freqüentemente com a confissão na qual se acuse de
todos os seus defeitos e negligências em servir-me." - Cassiano ensina que
a alma que aspira à perfeição, deve cuidar de ter uma grande pureza de
consciência, porque assim é que se adquire o perfeito amor de Deus, que não se
dá senão às almas puras; de sorte que o divino amor corresponde à pureza do
coração.
- É preciso, porém entender que nos homens, segundo o estado presente, esta
pureza não consiste em uma isenção absoluta de toda a falta; porque, exceto
nosso divino Salvador e sua divina Mãe, não houve nem haverá no mundo nenhuma
alma sem suas manchas. Todos nós nascemos em pecado e caímos em muitas faltas,
diz S. Tiago.
- Consiste em duas coisas, que são velar atentamente para que não entre no
coração nenhuma falta deliberada, por leve que seja, e ter cuidado de
purificar-se imediatamente de qualquer falta que nele possa ter entrado.
- Estes são justamente os dois bons efeitos que produz a confissão freqüente.
Primeiramente, pela
confissão freqüente, uma pessoa se purifica das manchas contraídas. - A este
propósito, narra S.
João Clímaco que um jovem, desejando corrigir-se da má vida, que levava no
século, foi-se fazer religioso em certo mosteiro. Antes de recebê-lo, o abade
quis prová-lo; e lhe disse que, se queria ser admitido, fosse confessar em
público todos os seus pecados. Deveras resolvido a se entregar inteiramente a
Deus, o jovem obedeceu; mas, enquanto expunha suas faltas diante da comunidade,
um santo religioso que fazia parte desta, viu um homem de aspecto venerando,
que a medida que o moço ia declarando seus pecados, os apagava de um papel que
tinha na mão, onde estavam escritos; de sorte que, acabada a confissão, todos
estavam apagados.
- O que, neste caso, aconteceu visivelmente, sucede invisivelmente toda a vez
que um se confessa com as devidas disposições.
- A confissão, porém, além de purificar a alma de suas máculas, dá-lhe também
força para não recair. -
Santo Afonso Maria de Ligório |
- A tal propósito S.Bernardo refere um fato da vida de S. Malaquias.Uma mulher
tinha o hábito de se impacientar e de se irritar a tal ponto que se tornara
insuportável. S. Malaquias, ouvindo dela mesma que nunca se houvera confessado
de tais impaciências, excitou-a a fazer uma confissão exata dessas faltas.
Depois disto, tornou-se tão paciente e tão branda, que parecia incapaz de se enfadar
por qualquer trabalho ou mau trato que a importunasse.É por isso que muitos
santos, para adquirirem a pureza de consciência, costumavam confessar-se todos
os dias. Assim praticavam Sta. Catarina de Senna, Sta. Brígida, a Beata
Collecta, e também S.Carlos Borromeo, Sto. Inácio de Loiola e muitos outros. S.
Francisco de Borgia não se contentava com uma só vez, confessava-se duas vezes
por dia.
- Se os homens do
mundo tem horror de aparecer com uma mancha no rosto diante de seus amigos, que
se há de estranhar que as almas amigas de Deus procurem purificar-se cada vez
mais, para se tornarem cada vez mais agradáveis aos olhos de Nosso Senhor.- De
resto, não pretendemos aqui obrigar as religiosas que freqüentam a comunhão, a
confessar-se toda a vez que comungam. Entretanto é conveniente que se confessem
duas vezes ou ao menos uma vez por semana, e além disso quando houverem
cometido alguma culpa com advertência.
DO EXAME, DA DOR OU CONTRIÇÃO E DO BOM PROPÓSITO
- Sabe-se que, para fazer uma boa confissão, três coisas se requerem: O exame
de consciência, a dor de ter pecado, e o propósito de se corrigir.
1. Quanto ao exame, aos que freqüentam os sacramentos, não é necessário que quebrem a cabeça em indagar todos os pormenores das faltas veniais. É preferível que se apliquem mais a descobrir as causas e raízes de seus apegos e de suas negligências.Digo isto para as religiosas que vão se confessar, com a cabeça cheia de coisas ouvidas na grade, e não fazem outra coisa que repetir, de cada vez, a recitação das mesmas faltas, como uma cantilena, sem arrependimento e sem propósito de emenda.Para as almas espirituais, que se confessam amiúde e tem cuidado de evitar os pecados veniais deliberados, o exame não exige muito tempo; pois não têm necessidade de indagar sobre as faltas graves, porque se a sua consciência estivesse sobrecarregada de um só pecado mortal, este se daria logo a conhecer por si mesmo. Quanto aos pecados veniais, se fosse plenamente voluntários, se manifestariam também de um modo sensível de pena que causariam; aliás não há obrigação de confessar todas as faltas leves que se tem na consciência, e por conseguinte também não há obrigação de fazer um exame exato e menos ainda de escrutar o número e circunstâncias, ou se recordar como e porque se cometeram.Basta declarar as faltas leves que pesam mais e são mais opostas a perfeição, e acusar as outras em termos gerais.
- Quando não há matéria certa depois da confissão última, diga-se algum pecado
da vida passada, de que se tenha mais dor, por exemplo: Eu me acuso
especialmente de todas as culpas cometidas no passado contra a caridade, a
pureza ou a obediência.
- É bastante consolador o que sobre este ponto escreve S. Francisco de Sales:
"Não vos inquieteis, se não vos lembrardes de todas as vossas faltinhas
para confessá-las; porque assim como muitas vezes cais sem advertência, assim
também muitas vezes vos levantareis sem percebê-lo; a saber, pelos atos de amor
ou outros atos bons que as almas devotas soem fazer".
2. É necessária, em segundo lugar, a dor ou contrição, e é o que se requer
principalmente para obter a remissão dos pecados. As confissões mais longas não
são as melhores, mas as em que há mais dor. O sinal de uma boa confissão, diz
S. Gregório, não se acha no grande número de palavras do penitente, mas no
arrependimento que demonstra.
- De resto, as religiosas que se confessam amiúde e tem horror até as culpas
veniais, desfazem as dúvidas se tem ou não verdadeira contrição. Quereriam,
cada vez que se confessam, ter lágrimas de enternecimento; e como apesar dos
seus esforços e de toda a violência que fazem, não podem tê-las, estão sempre
inquietas sobre suas confissões. É preciso que se persuadam que a verdadeira
dor não está em senti-la mas em querê-la. Todo o mérito das virtudes está na
vontade. É por isso que Gerson, falando da fé, assegura que aquele que quer
crer, algumas vezes tem mais mérito do que aquele que crê.
- Mas S. Tomás ensinou a mesma coisa antes dele, falando precisamente da
contrição. Diz ele que a dor essencial, necessária para a confissão, é a
detestação do pecado cometido, e que esta dor não está na parte sensitiva, mas
na vontade; visto que a dor sensível é um efeito do desprazer da vontade o que
nem sempre está em nosso poder, porque a parte inferior nem sempre segue a
parte superior.
Assim, pois, toda a vez que, na vontade, a displicência da culpa
cometida é acima de todos os males, a confissão é boa.
- Abstende-vos,
portanto, de fazer esforços para sentir a dor. - Falando dos atos internos,
sabei que os melhores são os que se fazem com menor violência e maior
suavidade, visto que o Espírito Santo ordena tudo com doçura e tranqüilidade.
Pelo que, o santo
rei Ezequias, falando do arrependimento que tinha de seus pecados, dizia sentir
deles dor muito amarga mas em paz.
Quando quiserdes receber a absolvição, fazei assim: No aparelhar-vos para a
confissão, começai por pedir a Jesus Cristo e a Virgem das Dores uma verdadeira
dor de vossos pecados; em seguida fazei brevemente o exame, como acima
dissemos; e depois, para a contrição, basta que façais um ato como este:
"Meu Deus, eu vos amo acima de todas as coisas; espero, pelos merecimentos
do sangue de Jesus Cristo, o perdão de todos os meus pecados, dos quais me
arrependo de todo o coração, por ter ofendido e desgostado a vossa infinita
bondade, e os aborreço mais do que todos os males; e uno este meu aborrecimento
ao aborrecimento que deles teve o meu Jesus no horto de Getsêmani. Proponho não
vos ofender mais, com a vossa graça".Uma vez que tenhais querido pronunciar
este ato com sinceridade, ide tranqüilamente receber a absolvição, sem temor e
sem escrúpulo. - Sta. Teresa para tirar as angústias a este respeito, dava um
outro bom sinal de contrição: "Vede, dizia ela, se tendes um verdadeiro
propósito de não cometer mais os pecados que ides confessar. Se tendes este
propósito, não duvideis de ter também a verdadeira dor".
3. É necessário enfim o bom propósito. O propósito exigido para a confissão,
para ser bom, deve ser firme, universal e eficaz.Primeiramente, deve ser firme.
Há alguns que dizem: eu não quereria cometer mais este pecado; eu não quereria
mais ofender a Deus. - Mas ai! este eu quereria denota que o propósito não é
firme. Para que o seja, é necessário dizer com vontade resoluta: Não quero mais
ofender a Deus deliberadamente.Em segundo lugar, deve ser universal, isto é,
deve o penitente propor-se a evitar todos os pecados sem exceção. Isto, porém,
só se entende dos pecados mortais.
Quanto aos pecados
veniais, basta, para o valor do sacramento, que o arrependimento e o propósito
recaiam sobre uma só espécie de pecado; mas as pessoas mais espirituais devem
propor se evitar todos os pecados veniais deliberados; e quanto aos
indeliberados, visto que é impossível evitá-los todos, basta que se proponham fazê-lo
quanto for possível.Em terceiro lugar, deve ser eficaz, isto é, capaz de
determinar o penitente a empregar os meios necessários para não cometer mais as
faltas de que se acusa, e especialmente a fugir das ocasiões próximas de
recair. Por ocasião próxima se entende aquela em que a pessoa caiu muitas vezes
em pecados graves, ou, sem justa causa, induziu outros a caírem.Neste caso não
basta propor-se somente evitar o pecado, mas é necessário também propor tirar a
ocasião, aliás as suas confissões serão todas nulas, embora receba mil
absolvições; pois não querer remover a ocasião próxima de pecado grave já é por
si culpa grave. E assim como temos demonstrado na nossa obra de teologia moral,
quem recebe a absolvição sem o propósito de tirar a ocasião próxima, comete um
novo pecado mortal de sacrilégio."
(Livro : Santo Afonso Maria de Ligório - A Verdadeira Esposa de Jesus Cristo)
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