Da Regra de São Bento, abade
(Prologus,
4-22;cap.72,1-12:CSEL75,2-5.162-163)
(Séc.VI)
Antes de tudo, quando quiseres realizar
algo de bom, pede a Deus com oração muito insistente que seja plenamente
realizado por ele. Pois já tendo se dignado contar-nos entre o número de seus
filhos, que ele nunca venha a entristecer-se por causa de nossas más ações.
Assim, devemos em todo tempo pôr a seu serviço os bens que nos concedeu, para
não acontecer que, como pai irado, venha a deserdar seus filhos; ou também,
qual Senhor temível, irritado com os nossos pecados nos entregue ao castigo
eterno, como péssimos servos que o não quiseram seguir para a glória.
Levantemo-nos, enfim, pois a Escritura
nos desperta dizendo: Já é hora de levantarmos do sono (cf. Rm
13,11). Com os olhos abertos para a luz deífica e os ouvidos atentos, ouçamos a
exortação que a voz divina nos dirige todos os dias: Oxalá, ouvísseis
hoje a sua voz: não fecheis os corações (Sl 94,8); e ainda: Quem
tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às Igrejas (Ap 2,7).
E o que diz ele? Meus filhos,
vinde agora e escutai-me: vou ensinar-vos o temor do Senhor (Sl
33,12). Correi, enquanto tendes a luz da vida, para que as trevas não
vos alcancem (cf. Jo 12,35).
Procurando o Senhor o seu operário na
multidão do povo ao qual dirige estas palavras, diz ainda: Qual o homem
que não ama sua vida, procurando ser feliz todos os dias? (Sl 33,13).
E se tu, ao ouvires este convite, responderes: Eu, dir-te-á Deus: Se
queres possuir a verdadeira e perpétua vida, afasta a tua língua da maldade, e
teus lábios, de palavras mentirosas. Evita o mal e faze o bem, procura a paz e
vai com ela em seu caminho (Sl 33,14-15). E quando fizeres isto, então
meus olhos estarão sobre ti e meus ouvidos atentos às tuas preces; e antes
mesmo que me invoques, eu te direi: Eis-me aqui (Is 58,9).
Que há de mais doce para nós,
caríssimos irmãos, do que esta voz do Senhor que nos convida? Vede como o
Senhor, na sua bondade, nos mostra o caminho da vida!
Cingidos, pois, os nossos rins com a fé
e a prática das boas ações, guiados pelo evangelho, trilhemos os seus caminhos,
a fim de merecermos ver aquele que nos chama a seu reino (cf.
1Ts 2,12). Se queremos habitar na tenda real do acampamento desse reino, é
preciso correr pelo caminho das boas ações; de outra forma, nunca chegaremos lá.
Assim como há um zelo mau de amargura,
que afasta de Deus e conduz ao inferno, assim também há um zelo bom, que separa
dos vícios e conduz a Deus. É este zelo que os monges devem pôr em prática com
amor ferventíssimo, isto é, antecipem-se uns aos outros em atenções recíprocas (cf.
Rm 12,10). Tolerem pacientissimamente as suas fraquezas, físicas ou morais;
rivalizem em prestar mútua obediência; ninguém procure o que julga útil para
si, mas sobretudo o que o é para o outro; ponham em ação castamente a caridade
fraterna; temam a Deus com amor; amem o seu abade com sincera e humilde
caridade; nada absolutamente prefiram a Cristo; e que ele nos conduza todos
juntos para a vida eterna.
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