Que devoção será mais
apropriada para nos incutir aversão à ofensa de Deus e dor dos pecados
cometidos, do que a devoção ao Sagrado Coração? Certamente não podemos
contemplar esse Coração encimado por uma cruz e cercado de espinhos, sem pensar
que foram os nossos pecados que amarguraram tanto o coração do amantíssimo
Salvador. Nossos pecados ocasionaram ao divino Redentor uma agonia contínua.
O Pe. Léssio afirma que a ingratidão dos homens por si só seria
suficiente para tirar mil vezes a vida de Jesus Cristo.
Por causa dessa ingratidão Ele chorou no Presepe de Belém, suou
sangue no jardim de Getsêmani e morreu no mais completo desamparo e privado de
toda a consolação na Cruz.
Nosso Senhor revelou à Beata Ágata da Cruz que nada O contristou tanto no seio de
Sua Mãe como a vista dos corações insensíveis que haveriam de desprezar,
depois de concluída a redenção, as graças para cuja dispensação Ele veio ao
mundo. A mesma coisa já dissera o
Senhor muito tempo antes, segundo a interpretação comum dos Santos Padres, pela
boca do Profeta: "Que proveito haverá ao meu
sangue, se eu descer à corrupção?" (Sl 29,10).
O pensamento no grande tormento que o pecado ocasionou ao
Santíssimo Coração de Jesus encheu de dor a todos os santos penitentes. O
Senhor deu uma vez a conhecer a Santa Catarina de Gênova a fealdade de um só
pecado venial, e a santa, a essa vista, se aterrorizou tanto e sentiu uma tão
grande for, que caiu desfalecida. Por isso protestou diante do Crucifixo que
nunca mais queria cometer um pecado: Nenhum pecado mais, Senhor; nenhum pecado mais,
exclamou ela. Lemos que alguns
penitentes, sendo por Deus iluminados sobre a malícia de seus pecados, morreram
de dor.
De fato, como será possível deixar de chorar os próprios pecados,
quando se pondera que eles foram o cruel lagar que, pela aflição e tristeza,
espremeu tanto sangue do Coração de Jesus?
Se a devoção ao Coração de Jesus incute horror ao pecado, contudo,
não tira ao pecador a esperança de obter o perdão; antes, mostra-lhe que tem de
tratar com um coração infinitamente compassivo. Oh! como é grande a compaixão
do Coração de Jesus para com o pecador. A misericórdia foi que O levou a descer
do céu à terra; ela O fez dizer que Ele é o bom Pastor que dá a Sua vida para
salvar as Suas ovelhas. Para nos obter o perdão a nós, pecadores, não se poupou
a Si mesmo.
Quis sacrificar-Se na Cruz, por nós, para satisfazer, por Sua
paixão, pelas penas que merecêramos. Por essa misericórdia e por essa compaixão
diz Ele, ainda agora:
"Por que quereis morrer, ó casa de Israel?" (Ez. 18,21). Ó homens, pobres filhos
Meus, por que quereis perder-vos, fugindo de Mim? Não vedes que, separando-vos
de mim, vos entregais à morte eterna? Não quero que vos percais; tende
confiança; voltai atrás todas as vezes que quiserdes; recebereis sempre nova
vida: "Convertei-vos e vivei" (Ez.
18,22).
Foi também essa compaixão que O levou a comparar-Se a um pai
amoroso que, vendo-se desprezado por seu filho, contudo não o repele, quando se
volta, arrependido, a ele, chegando até a abraçá-lo ternamente e a esquecer
todas as injúrias que dele sofreu. "Não me recordarei mais de
todas as suas iniquidades". (Ezeq 18,22)
(Escola da Perfeição Cristã para seculares e religiosos, obra
compilada dos escritos de Santo Afonso Maria de Ligório, Doutor da Igreja, pelo
Pe. Saint Omer, C.SS.R, vertida para o português segundo a edição alemã do Pe.
Paulo Leich pelo Pe. José Lopes, C.SS.R, edição de 1955)
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