Amados leitores as postagem que diariamente estamos
disponibilizando em nosso blog TRATADO DA CASTIDADE de Santo Afonso, é um
texto antigo e por tal motivo permeado da concepção histórica daquele período,
contudo nosso trabalho deve ser uma leitura crítica trazendo para os nossos
dias estes aconselhamento de continência no olhar.
O
mundo nos apresenta muitos perigos que se iniciam através de imagens imorais
que assaltam constantemente a pureza das almas.
Propomos-nos
futuramente disponibilizar um material revisado, com base neste, para dar uma
visão mais atual visando assim ajudar ainda mais a vivermos no tempo presente a
virtude da castidade. Boa leitura.
3ª Parte
§ III. DA MODÉSTIA DOS OLHOS
TRATADO DA
CASTIDADE
Bem-aventurados
os puros
(SANTO
AFONSO MARIA DE LIGÓRIO)
3ª Parte
§ III. DA MODÉSTIA DOS OLHOS
Santo Afonso |
Aqui
vemos como o demônio nos tenta primeiramente a olhar, depois a desejar e,
finalmente, a consentir. Por isso nos assegura São Jerônimo que o demônio só necessita
de nosso começo: dá-se por satisfeito se lhe abrimos a metade da porta, pois ele
saberá conquistar a outra metade. Um olhar voluntário, lançado a uma pessoa do outro
sexo, acende uma faísca infernal que precipita a alma na perdição. "As
primeiras setas que ferem as almas castas, diz São Bernardo (De mod. ben. viv.,
serm. 23), e não raro as matam, entram pelos olhos". Por causa dos olhos
caiu Davi, esse homem segundo o coração de Deus. Por causa dos olhos caiu
Salomão, esse instrumento do Espírito Santo. Por causa dos olhos, quantas almas
não se perderam eternamente?
Vigie,
pois, cada um sobre seus olhos, se não quiser chorar uma vez com Jeremias:
"Meus olhos me roubaram a vida" (Jer 3, 51); as afeições criminosas
que penetraram em meu coração por causa dos meus olhares, lhe deram a morte.
São Gregório diz (Mor. 1, 21, c. 2): "Se não reprimires os olhos,
tornar-se-ão ganchos do inferno, que a força nos arrastarão e nos obrigarão,
por assim dizer, a pecar contra a nossa vontade". "Quem contempla
objeto perigoso, acrescenta o Santo, começa a querer o que antes não
queria". É também o que diz a Sagrada Escritura (Jdt 16, 11), quando diz
que a bela Judite escravizou a alma de Holofernes, apenas este a contemplou.
Sêneca
diz que a cegueira é mui útil para a conservação da inocência.
Seguindo
esta máxima, um filósofo pagão arrancou-se os olhos para guardar a castidade,
como nos refere Tertuliano. Isso, porém,
não é lícito a nós, cristãos; se queremos conservar a castidade, devemos,
contudo, fazer-nos cegos por virtude, abstendo-nos de olhar o que possa
despertar em nós os maus pensamentos. "Não contemples a beleza alheia;
disso origina-se a concupiscência, que queima como o fogo" (Ecli 9, 8). À
vista seguem-se as imaginações pecaminosas, que acendem o fogo impuro.
São
Francisco de Sales dizia: "Quem não quiser que o inimigo penetre na fortaleza,
deve conservar as portas fechadas". Por essa razão foram os Santos tão cautelosos
em seus olhares. Por temor de enxergarem inesperadamente qualquer objeto perigoso,
conservavam os olhos quase sempre baixos, e se abstinham de olhar coisas inteiramente
inocentes. São Bernardo, depois de um ano inteiro no noviciado, não sabia ainda
se o teto de sua cela era plano ou abobadado. Na igreja do convento havia três janelas
e ele não o sabia, porque conservara os olhos baixos. Evitavam os Santos, com cautela
maior ainda, pôr os olhos em pessoa de outro sexo. São Hugo, bispo, nunca olhava
para o rosto das mulheres com quem tinha de conversar. Santa Clara nunca olhava
para a face de um homem. Aconteceu uma vez que, levantando os olhos para a Hóstia
Sagrada, durante a Elevação, viu o rosto do sacerdote, com o que ficou profundamente
aflita.
Julgue-se
agora quão grande é a imprudência e temeridade dos que, não possuindo a virtude
dum desses Santos, ousam passear suas vistas em todas as pessoas, não
exceptuando as de outro sexo, e querendo ainda ficar livre de tentações e do
perigo de pecar. São Gregório diz (Dial. 1.2, c. 2) que as tentações que
levaram São Bento a revolver-se sobre espinhos, provieram de um olhar imprudente
sobre uma senhora. São Jerônimo, achando-se na gruta de Belém, onde
continuamente orava e macerava seu corpo com as mais atrozes penitências, foi
por longo tempo atormentado pela lembrança das damas que vira tempos antes em
Roma. Como, pois, poderemos ficar preservados de tentações, quando nos expomos
ao perigo, olhando e até fitando complacentemente pessoas de outro sexo?
O
que nos prejudica não é tanto o olhar casual como o premeditado, o mirar.
Razão
porque Santo Agostinho diz (Reg. ad Serv. Dei, n. 6): "Se vossos olhos casualmente
caírem sobre uma pessoa, cuja vista vos pode ser prejudicial, guardai-vos, ao
menos, de fitá-la". E São Gregório diz: "Não é lícito contemplar ou
extasiar-se com a vista daquilo que não é lícito desejar, pois, ainda que
expulsemos os maus pensamentos que costumam seguir o olhar voluntário, deixam
sempre uma mancha na alma". Tendo-se perguntado ao irmão Rogério,
franciscano, dotado de uma pureza angélica, por que se mostrava tão reservado
em seus olhares, quando tratava com mulheres, respondeu: "Se o homem foge
à ocasião, Deus o protege; se se expõe a ela, Nosso Senhor o abandona e facilmente
cairá no pecado".
Suposto
mesmo que a liberdade que se concede aos olhos não produzisse outros males,
impediria sempre o recolhimento da alma durante a oração; pois tudo o que vimos
e nos impressionou, apresenta-se aos olhos de nossa alma e nos causa uma imensidade
de distrações. Quem já tem recolhimento de espírito durante a oração, tome muito
cuidado para não se ver privado dessa graça dando liberdade a seus olhos. Está
fora de dúvida que um cristão que vive sem recolhimento de espírito não pode
praticar as virtudes cristãs da humildade, da paciência, da mortificação, como deveria.
Guardemo-nos, por isso, de olhares curiosos, e só olhemos para objetos que elevam
para Deus o nosso espírito. "Olhos baixos elevam o coração para o
Céu", dizia São Bernardo. São Gregório Nazianzeno (Ep. ad Diocl.) escreve:
"Onde habita Cristo com Seu amor, reina aí a modéstia". Com isso não
quero, porém, dizer que nunca se deva levantar os olhos ou considerar coisa
alguma; pelo contrário, é até bom, às vezes, olhar coisas que elevam nosso
coração para Deus, como santas imagens, prados floridos, etc, já que a beleza
dessa criatura nos atrai à contemplação do Criador. Deve-se notar também que a
modéstia dos olhos é necessária não só para nosso próprio bem, como para a
edificação do próximo. Só Deus vê o nosso coração; os homens vêem apenas nossas
obras externas e, ou se edificam, ou se escandalizam com elas. "Pelo rosto
se conhece o homem", diz a Escritura (Ecli 19, 26), isto é, pelo exterior se
depreende o que é o homem interiormente. Todo cristão, por isso, deve ser o que
era São João Batista, conforme as palavras do Salvador (Jo 5, 35): "Uma lâmpada que arde e ilumina".
Interiormente deve arder em amor divino; exteriormente, alumiar, pela modéstia,
a todos os que o vêem. Também a nós se podem aplicar as palavras que São Paulo
dirigiu a seus discípulos (I Cor 4, 9): "Somos o espetáculo dos anjos e
dos homens". "A vossa modéstia seja conhecida de todos os
homens" (Filip 4, 5).
Pessoas
devotas são observadas pelos anjos e pelos homens, e, por isso, sua modéstia
deve ser notória a todos, do contrário, deverão dar rigorosas contas a Deus no dia
do Juízo. Observando a modéstia, edificamos sumamente os outros e os estimulamos
à prática da virtude.
É
celebre o que se conta de São Francisco de Assis: Uma vez deixou ele o convento
junto a um companheiro, dizendo que ia pregar; tendo dado uma volta pela cidade
com os olhos baixos, entrou novamente no convento. 'Mas quando farás o sermão?',
perguntou-lhe o companheiro. 'Já o fiz, respondeu-lhe o Santo, consistiu todo no
resguardo dos olhos, do que demos exemplo ao povo'.
Santo Ambrósio diz que a modéstia das pessoas
virtuosas é uma exortação mui poderosa ao coração dos mundanos. "Quão belo
não seria se bastasse te apresentares em público para fazeres bem aos
outros!" (In ps. 118, s. 10). De São Bernardino de Sena se conta
que, mesmo antes de entrar para o convento, bastava só a sua presença para pôr fim
às conversas livres de seus companheiros; mal o avistavam, diziam uns para os outros:
Silêncio, Bernardino vem vindo; e então calavam-se ou começavam a falar de outras
coisas. Santo Efrém, segundo o testemunho de São Gregório de Nissa, era tão modesto,
que já a sua vista estimulava à devoção, e não se podia vê-lo sem se sentir levado
a se tornar melhor. Mais admirável ainda é o que nos refere Suvio, do santo sacerdote
e mártir Luciano: só por sua modéstia moveu muitos pagãos a abraçarem a santa
Fé. O imperador Mazimiano, que fôra disso informado, temendo sentir a sua influência
e ser obrigado a converter-se, citou-o à sua presença, mas não quis vê-lo, e sujeitou-o
ao interrogatório ocultando-o a suas vistas por uma cortina estendida entre os dois.
Nosso
ideal mais perfeito de modéstia foi, porém, o nosso Divino Salvador mesmo,
pois, como nota um célebre autor, os Evangelistas dizem, várias vezes, que o Redentor
levantou os olhos em certas ocasiões, dando a entender, com isso, que tinha ordinariamente
os olhos baixos. Por isso exalta o Apóstolo a modéstia de seu Divino Mestre,
escrevendo a seus discípulos: "Rogo-vos pela mansidão e modéstia de
Cristo" (II Cor 10, 1).
Concluo
com as palavras de São Basílio a seus monges: "Se quisermos que nossa alma
tenha suas vistas sempre postas no Céu, filhos queridos, conservemos nossos
olhos sempre voltados para a terra". De manhã, ao despertar, devemos já
pedir, com o Profeta: "Afastai meus olhos, Senhor, para que não vejam a
vaidade" (Sl 118, 37).
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