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terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Cardeal Muller dá interpretação final da Amoris Lætitia



Na semana passada foi publicada uma entrevista com o Cardeal Gerhard Muller, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Além do Papa, é ele que tem autoridade para interpretar os documentos da Igreja de acordo com o Magistério, como ele próprio diz na entrevista.

Nos últimos meses surgiram entre alguns bispos dúvidas sobre a interpretação correta da exortação apostólica Amoris Lætitia. Nesta entrevista o Cardeal Muller não disse nenhuma novidade, mas voltou a esclarecer que a única interpretação possível da Amoris Lætitia é a que está de acordo com o Catecismo da Igreja Católica.

Aqui fica parte da entrevista:

Pode haver alguma contradição entre a Tradição e a própria consciência?

Não, é impossível. Por exemplo, não se pode dizer que haja circunstâncias em que um adultério não constitui um pecado mortal. Para a doutrina católica é impossível a coexistência entre o pecado mortal e a graça santificante. Para superar esta absurda contradição, Cristo instituiu para os fiéis o Sacramento da Penitência e Reconciliação com Deus e com a Igreja.

Esta é uma questão que se discute muito a propósito do debate em torno da exortação pós-sinodal Amoris Lætitia.

Amoris Lætitia deve ser interpretada claramente à luz de toda a doutrina da Igreja. (...) Eu não gosto disto, não está certo que tantos bispos estejam a interpretar a Amoris Lætitia de acordo com a sua maneira de entender o ensinamento do Papa. Isto não está de acordo com a doutrina Católica. O magistério do Papa é interpretado apenas por ele ou pela Congregação para a Doutrina da Fé. O Papa interpreta os bispos, não são os bispos que interpretam o Papa, isto é uma inversão da estrutura da Igreja Católica. Eu insisto com todos os que estão a falar demais para estudarem a doutrina sobre o papado e o episcopado. O bispo, como mestre da Palavra, tem que ser primeiro bem formado para não cair no risco do cego a guiar os cegos. (...)

A exortação Familiaris Consortio de São João Paulo II estipula que os casais divorciados e recasados que não se podem separar, para receberem os sacramentos, têm que decidir viver em continência. Este requisito ainda é válido?

Claro, não é dispensável. Porque isto não é apenas uma lei positiva de João Paulo II. Ele expressou um ensinamento essencial da teologia moral Cristã e da teologia dos sacramentos. A confusão neste ponto também tem a ver com a incapacidade de aceitar a encíclica Veritatis Splendor, com a doutrina clara sobre o "intrinsece malum." (...) Para nós o matrimônio é a expressão da participação na união entre o noivo, Cristo, e a Igreja, sua noiva. Isto não é, como alguns diziam durante o Sínodo, uma analogia simples e vaga. Não! É a substância do sacramento, e nenhuma autoridade no céu ou na terra, nem um anjo, nem o Papa, nem um concílio, nem a lei dos bispos, tem o poder para mudar isso.

Como é que se pode resolver o caos que se está a gerar por causa das diferentes interpretações que estão a ser dadas a esta passagem da Amoris Lætitia?

Eu insisto para que todos reflitam, estudando primeiro a doutrina da Igreja. Começando pela Palavra de Deus na Sagrada Escritura, que é muito clara sobre o matrimônio. Recomendo também não entrar numa casuística que pode facilmente originar mal-entendidos, especialmente aquele de que se o amor desaparece a ligação matrimonial morre. Isso são sofismas: a Palavra de Deus é muito clara e a Igreja não aceita a secularização do matrimônio. A tarefa dos sacerdotes e dos bispos não é criar confusão, mas trazer claridade. Uma pessoa não pode apenas olhar para as pequenas passagens na Amoris Lætitia mas tem que a ler como um todo, com o propósito de tornar o Evangelho do matrimônio e da família mais atrativo para as pessoas. Não foi a Amoris Lætitia que provocou a interpretação confusa, mas alguns intérpretes confusos. Todos temos de perceber e aceitar a doutrina de Cristo e da sua Igreja e ao mesmo tempo estar prontos para ajudar os outros a percebê-la e a pô-la em prática, mesmo em situações difíceis.

in Settimo Cielo

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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Dom Keller lança carta Pastoral sobre a Amoris Laetitia



Nota Pastoral A interpretação da Exortação Apostólica “Amoris Laetitia”, na Diocese de Frederico Westphalen.

A cada dia nós, Bispo e padres, pastores da Igreja, nos defrontamos com a realidade de católicos, nossos irmãos de fé, que vivem em situação matrimonial irregular, aqueles que contraindo validamente o Matrimônio, tendo-se divorciado, unem-se civilmente em um novo casamento, ou tão simplesmente convivem juntos. Tal realidade produz certamente, no caso de católicos conscientes, um grande sofrimento.


Já antes da celebração dos últimos Sínodos sobre a Família, não só falava-se sobre isto, mas em alguns lugares foi sendo introduzida a prática de se permitir o acesso destes irmãos católicos aos Sacramentos da Penitência e da Eucaristia, com a justificativa de se aplicar nestes casos, uma solução pastoral emergencial, desde que se verificassem algumas condições: um tempo longo de convivência, “arrependimento” das falhas pessoais em relação ao casamento frustrado, a existência de filhos na segunda união, a estabilidade econômica e afetiva, a vida fundamentada na fé, a indicação da própria consciência, a autorização dada por um sacerdote e outras. Assim sendo, muitas das proposições apresentadas por alguns padres sinodais, na verdade são já praticas aceitas em certas realidades eclesiais. Nós pastores da Igreja, sejamos sinceros, cansamos de ouvir nestes últimos anos aqueles que sempre preconizaram mudanças na prática sacramental da Igreja usando o princípio da mudança “de baixo para cima” ou o bem conhecido princípio do fato consumado: adota-se uma prática pastoral e com o tempo a Igreja seria obrigada a aceitá-la, incorporando-a à sua doutrina e à sua prática.

Tendo sido entregue à Igreja, pelo Santo Padre o Papa Francisco, a Exortação Apostólica “Amoris Laetitia”, com a responsabilidade pastoral de bispo da Santa Igreja, entendo que tal Documento pós Sinodal deva ser lido e interpretado no quadro da chamada “hermenêutica da continuidade e do aprofundamento”, o que significa dizer que uma melhor compreensão da doutrina moral da Igreja, fruto da ação do Espírito Santo, gradualmente nos conduz ao conhecimento da verdade inteira e completa, sem jamais contradizer ou negar o magistério precedente.

De nenhuma maneira a doutrina tradicional da Igreja em relação ao Sagrado Matrimônio, à absolvição Sacramental e à recepção da Sagrada Comunhão podem ser modificadas por alguém, já que a mesma é imutável e não pode submeter-se a opiniões pessoais, muito menos a uma questão de práticas impostas de baixo para cima, de princípios fundados em uma falsa misericórdia que aceita a Doutrina, mas que a nega posteriormente na prática pastoral.

Assim sendo, é preciso ler e compreender a Exortação Apostólica “Amoris Laetitia” à luz do Magistério precedente, já que, como o Santo Padre, o Papa Francisco sabiamente escreve, é neste quadro que ela deve ser lida e compreendida.

Frente às interpretações divergentes em relação a esta questão tão importante, que envolve a salvação eterna das pessoas, penso que seja fundamental expor com clareza o que a Igreja ensina a respeito, e não poderá ensinar outra doutrina diferente desta, sob o risco de trair a Verdade que lhe foi confiada por Nosso Senhor Jesus Cristo para ser anunciada por todo o sempre.

Além de obscurecer a sua Missão de anunciar o Evangelho do Matrimônio e da Família, a tão decantada “misericórdia”, que alguns pretendem impor no que diz respeito a uma flexibilidade doutrinal e pastoral pedida e já praticada em alguns lugares para estes casos, seria um verdadeiro acinte à plêiade de santos da Igreja que derramaram seu sangue na defesa da Doutrina tradicional do Matrimônio; um escândalo para tantos casais que vivem a fidelidade matrimonial, mas que carregam, em muitos casos, a cruz de uma união sacramental marcada por dificuldades e um desrespeito àqueles homens e mulheres que por razões diversas vivem nesta situação irregular, oferecendo por si e pelos seus a cruz de não poderem aproximar-se da Sagrada Eucaristia.

A Doutrina que a Igreja ensinou, ensina e ensinará, especialmente sobre a questão da recepção dos sacramentos da Penitência e da Eucaristia é clara: para se receber validamente o Sacramento da Penitência, além da confissão dos pecados e da satisfação, que é o cumprimento da penitência imposta pelo Confessor, é necessária a verdadeira contrição, que inclui em si o propósito de emenda. Sem essa condição, não é possível que alguém seja absolvido e possa receber a Sagrada Comunhão.

No caso de divorciados que voltaram a casar, e dos que simplesmente coabitam anteriormente validamente casados, enquanto os cônjuges são vivos, não é possível legitimar a segunda união civil através da celebração de um Matrimônio canônico.

Assim, a nova união marital constitui uma grave irregularidade, um verdadeiro pecado. Como consequência, para que um católico nessas circunstâncias possa ser sacramentalmente absolvido, a condição indispensável é o propósito de não cometer mais este pecado, que neste caso, pressupõe o abandono da vida em comum ou então, seja pelo vínculo afetivo, seja pela idade avançada, seja pela presença de filhos que não podem ser deixados de lado, seja por qualquer outra razão, o continuarem a viver juntos, mas como irmãos ([1]). Só nestas condições é que alguém poderá receber a Sagrada Comunhão.

Este é o ensinamento tradicional da Igreja, expresso de forma cabal na Exortação Apostólica Familiaris Consortio, que vale a pena recordar: “A Igreja, contudo, reafirma a sua práxis, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística os divorciados que contraíram nova união. Não podem ser admitidos, do momento em que o seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia. Há, além disso, um outro peculiar motivo pastoral: se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fiéis seriam induzidos em erro e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimonio.

A reconciliação pelo sacramento da penitência - que abriria o caminho ao sacramento eucarístico - pode ser concedida só àqueles que, arrependidos de ter violado o sinal da Aliança e da fidelidade a Cristo, estão sinceramente dispostos a uma forma de vida não mais em contradição com a indissolubilidade do matrimonio. Isto tem como consequência, concretamente, que quando o homem e a mulher, por motivos sérios - quais, por exemplo, a educação dos filhos - não se podem separar, «assumem a obrigação de viver em plena continência, isto é, de abster-se dos atos próprios dos cônjuges»”([2]).
Portanto, o Santo Padre, na Exortação pós Sinodal Amoris Laetitia em nenhum momento propõe que simplesmente se permita a recepção dos sacramentos da Penitência e da Eucaristia a pessoas que vivam em objetiva situação irregular em relação ao sacramento do Matrimônio, mas sim de discernir as situações em que, «por causa dos condicionalismos ou dos fatores atenuantes» (AL 305), possa alguém encontrar-se objetivamente em uma situação de pecado sem culpa grave correspondente. Portanto, contrariando aqueles que pretendem um abandono da prática tradicional da Igreja em relação a esta questão, não existe nenhuma mudança de rumo para estas situações, e a atenção pastoral individualizada nestas situações deve ser realizada sempre «evitando toda a ocasião de escândalo» (AL 299) e sem «nunca se pensar que se pretende diminuir as exigências do Evangelho» (AL 301).

Ao mesmo tempo, antes de tudo, se faz necessário reafirmar a Doutrina tradicional da Igreja. Mas segundo o Santo Padre, é preciso também, e bem situados neste quadro doutrinal, não esquecer o dever de se ajudar com misericórdia e caridade aos divorciados unidos em segunda união, ou aqueles que, após um casamento canônico, vivem maritalmente com outra pessoa, para que jamais se considerem abandonados, discriminados, diminuídos etc. em relação à Igreja. Tal auxílio espiritual e pastoral deve efetivar-se através do debruçar-se sobre esta sofrida realidade, como tão sabiamente recorda o Papa Francisco, através do anúncio da Palavra de Deus, do incentivo à participação na Santa Missa, da promoção da vida de oração, da vivência da caridade e da penitência, entre outras possibilidades.

Também, de forma concreta, de grande ajuda será o que estabeleceu o Santo Padre, através da reforma dos procedimentos nas causas matrimoniais. Aí está um caminho seguro e eficaz para certamente resolver muitas destas situações.

Ciente de que esta questão é de suma importância, como pastor da Igreja Diocesana de Frederico Westphalen, vou ainda oferecer aos padres desta Diocese um Documento oficial para a aplicação pastoral da Exortação pós Sinodal “Amoris Laetitia”, dentro desta hermenêutica de interpretação, fundamentada nos princípios da continuidade e do aprofundamento.

Invoquemos as luzes do Espírito Santo, para que possa iluminar a todos, pastores e rebanho, afim de que este Documento pós Sinodal se transforme em um marco doutrinal e pastoral, no que diz respeito a esta questão tão importante para a vida da nossa Igreja Diocesana e para o bem de todos os fiéis.

“Emitte Spiritum tuum et creabuntur et renovabis faciem terrae”.

+ Antonio Carlos Rossi Keller
Bispo de Frederico Westphalen

[1] Carta Haec Sacra Congregatio, Congregação para a Doutrina da Fé, de 11-IV-1973.
[2] São João Paulo II, Exortação Apostólica Pós Sinodal Familiaris Consortio,n.84.

Via: Site da Diocese de Frederico Westphalen

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