A vida acadêmica impõe sérios desafios aos jovens, mormente àqueles
que desejam viver de acordo com os preceitos de sua fé. A estrutura
universitária atual é montada para inibir a religião. Isso se mostra ainda mais
flagrante quando se está a pensar no cristianismo. De fato, o posicionamento
cristão — em especial o católico — dentro de uma universidade é quase como que
um suicídio social. Os alunos religiosos são frequentemente intimidados — seja
pelos colegas de classe, seja pelos professores — a esconderem suas opiniões, a
fim de que possam sobreviver aos anos de estudo.
É suficiente pensar em dois casos particulares que aconteceram no
Brasil há algumas semanas para se ter um panorama da situação: a arbitrária retirada de uma imagem de Nossa
Senhora do Bom Conselho da Faculdade de Direito do Recife e o aprisionamento das cartilhas
"Chaves para bioética", a mando do Ministério Público, na
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Embora a academia seja um
campo onde deve existir o livre debate e o pluralismo de ideias, a militância
dita "progressista" impõe a todo o corpo universitário uma agenda
ideológica e sem nenhum compromisso com a verdade. Assim, enquanto as imorais cartilhas de
"educação sexual" da Unicefcirculam livremente em escolas,
colégios e faculdades, o Ministério Público acata o pedido de alguns
professores contrários à castidade, recolhendo o material da Fundação Jérôme
Lejeune, distribuído na UERJ. Reina, de fato, o que Bento XVI chamou de
"ditadura do relativismo". Não existe diálogo, não existe ciência
séria. Ao contrário, no mais da vezes, os cursos são verdadeiros laboratórios
de doutrinação.
No discurso que proferiria à
Universidade de Roma La Sapienza, em 2008,
Bento XVI faz a seguinte consideração: "Diante duma razão não histórica
que procura autoconstruir-se somente numa racionalidade não histórica, a
sabedoria da humanidade como tal - a sabedoria das grandes tradições religiosas
- deve ser valorizada como realidade que não se pode impunemente lançar para o
cesto da história das ideias". Ora, não foi exatamente isso que fizeram o
Ministério Público, recolhendo as cartilhas, a Faculdade de Direito do Recife,
expurgando uma imagem histórica do prédio da instituição, e meia dúzia de
professores e alunos intolerantes, ao impedir a participação do Santo Padre na
abertura do ano letivo da Universidade de Roma? Jogaram na lata de lixo da
história dois mil anos de sabedoria e progresso, cujo legado abarca inclusive a La
Sapienza, fundada ainda no século XIII, pelo Papa Bonifácio VIII.
Os chamados padres da Igreja identificaram na filosofia em vigor à
época — não nas religiões pagãs e míticas — as sementes do Evangelho, as quais
o cristianismo teria a missão de desenvolver posteriormente. Ao início do
pensamento cristão, a fé católica aparece como a continuação e o acabamento do
pensamento filosófico, não como extensão da religiosidade popular. A famosa
conversão de São Justino deve-se justamente a essa importância da razão dentro
do cristianismo. No seu Diálogo com Trifão, ele narra como
sua peregrinação em busca da verdade levou-o a Deus e à "verdadeira
filosofia". Foi também o itinerário percorrido por muitos outros santos,
mas sobretudo por Santo Agostinho. No cristianismo, o santo bispo de Hipona
pôde perscrutar as raízes da verdade: "Tarde te amei, ó Beleza tão antiga
e tão nova, tarde te amei! Estavas dentro de mim e eu estava fora, e aí te
procurava… Estavas comigo e eu não estava contigo" .
Essa sede de verdade impulsionada pela Igreja e
seus pensadores ao longo dos séculos teve papel imprescindível para o
surgimento das universidades. O historiador Thomas E. Woods, em seu famoso
livro "Como a Igreja Católica construiu a civilização ocidental",
desmitifica a ideia de que a Idade Média foi um período de ignorância e
superstição. À Igreja, diferentemente do que se costuma ensinar nos cursos de
história, coube o papel de salvaguardar e desenvolver o conhecimento da
humanidade. Woods comenta :
A Universidade foi um fenômeno completamente
novo na história da Europa. Nada de parecido existiria na Grécia ou na Roma
antigas. A instituição que conhecemos atualmente, com as suas Faculdades,
cursos, exames e títulos, assim como a distinção entre estudos secundários e
superiores, chegaram-nos diretamente do mundo medieval. A Igreja desenvolveu o
sistema universitário porque, com as palavras do historiador Lowrie Daly, era
"a única instituição na Europa que manifestava um interesse consistente
pela preservação e cultivo do saber".
Com efeito, o rótulo de persona non grata imposto ao jovem católico dentro da
academia — principalmente quando se manifesta contrário às opiniões dominantes
no círculo universitário —, resume-se tão somente a um preconceito tacanho da
parte daqueles que desejam colocar a religião entre parêntesis. A contribuição
da Igreja Católica à ciência, em que pese as acusações contra a Inquisição e
erros pontuais na avaliação de novas descobertas, supera a de qualquer outra
instituição. Dão testemunho disso os 48 prêmios Nobel da Pontifícia
Academia das Ciências. Entre os nomes notáveis que figuram nessa
lista estão o brasileiro Miguel Nicolelis e o inglês Stephen Hawking. Sim, dois
ateus. A Igreja, ao contrário dos dogmáticos militantes anticlericais, é capaz
de reconhecer os progressos da humanidade, ainda que seus idealizadores não
sejam crentes.
Bento XVI, ao encontrar-se com os jovens em
Madrid, durante a 26ª Jornada Mundial da Juventude, não deixou de
animá-los a perseguir o caminho de Cristo, mesmo diante dos desafios:
Há muitos que, por causa da sua fé em Cristo,
são vítimas de discriminação, que gera o desprezo e a perseguição, aberta ou
dissimulada, que sofrem em determinadas regiões e países. Molestam-lhes
querendo afastá-los d'Ele, privando-os dos sinais da sua presença na vida
pública e silenciando mesmo o seu santo Nome. Mas, eu volto a dizer aos jovens,
com todas as forças do meu coração: Que nada e ninguém vos tire a paz; não vos
envergonheis do Senhor. Ele fez questão de fazer-se igual a nós e experimentar
as nossas angústias para levá-las a Deus, e assim nos salvou.
Dentro da universidade, o católico é chamado a
dar testemunho da verdade, infundindo, por meio do apostolado pessoal e
fecundo, as Palavras do Evangelho entre os demais. É chamado, sobretudo, a
contribuir para o progresso e exercício da autêntica ciência: "a busca
metódica, em todos os domínios do saber, se for conduzida de modo
verdadeiramente científico e segundo as normas da moral, jamais estará em
oposição à fé" . Não há por que se envergonhar de Cristo. Estar ao lado de
Deus é estar ao lado da verdadeira razão.
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